segunda-feira, 6 de novembro de 2017

A importância da ligação Lisboa-Pico-Lisboa no contexto do "Triângulo"


As ilhas do Pico, Faial e São Jorge formam o chamado "Triângulo", expoente máximo da sensação de arquipélago na Região Autónoma dos Açores: ilhas com paisagens e culturas diferentes mas que se avistam entre si todos os dias. Por outro lado, o "Triângulo" tem a particularidade única a nível regional de nele ser possível usufruir de ligações marítimas diárias entre as três ilhas, ligações estas que funcionam como verdadeiras pontes que contribuem para a coesão social, económica e territorial dos Açores, tal como referido no Plano Integrado dos Transportes dos Açores (PIT).

Se a deslocação interna dentro do "Triângulo" está assegurada por via marítima, as ligações ao exterior estão fortemente dependentes do transporte aéreo. No entanto, essas mesmas ligações aéreas permitem hoje ligar diretamente a capital portuguesa a duas das três ilhas do "Triângulo" (Pico e Faial). Por outras palavras, é possível chegar de Lisboa a uma localidade do "Triângulo", e vice-versa, com apenas uma viagem de avião e, eventualmente, uma viagem de barco. Esta é uma mais-valia e um grande factor de desenvolvimento do "Triângulo", o qual merece ser destacado e potenciado.

Contudo, a conjugação entre os horários dos barcos e os dos aviões pode levar a que a ligação Lisboa-"Triângulo"-Lisboa seja muito demorada ou mesmo irrealizável em algumas situações para todas as três ilhas, levando os passageiros a optarem pela opção de duas ou mais viagens aéreas com escalas em outras ilhas que não as do "Triângulo", diminuindo, assim, a importância e o potencial das ligações diretas entre Lisboa e o "Triângulo".

Importa, por isso, analisar como os voos diretos provenientes de/com destino a Lisboa servem todo o "Triângulo" na atualidade, isto é, durante o Inverno IATA 2017/2018. Comece-se, então, pela averiguação da frequência semanal dos voos da Azores Airlines com relevância para esta questão: Lisboa-Pico-Lisboa e Lisboa-Horta-Lisboa — vide tabela seguinte.

Voo
(chegada/partida)
Dia da semana
2.ª 3.ª 4.ª 5.ª 6.ª S. D.
LIS/PIX/LIS
(13h15/14h05)
X






LIS/PIX/LIS
(15h15/16h05)





X

LIS/HOR/LIS
(15h15/16h05)

X





LIS/HOR/LIS
(09h45/10h35)


X

X

X

Como é possível constatar, às segundas-feiras e sábados a ilha montanha é servida por voos diretos com a capital portuguesa (uma rotação em cada dia), sendo que situação equivalente ocorre na ilha azul às terças, quartas, sextas e domingos. Deste modo, e como primeira conclusão, verifica-se que às quintas-feiras não é possível chegar a um qualquer ponto do "Triângulo" partindo de Lisboa, e vice-versa, a não ser que se efetue uma escala aérea noutro ponto do arquipélago açoriano.

Ainda assim, haver ligação direta entre Lisboa e o Pico ou o Faial não é sinónimo de garantia de uma boa ligação entre a capital portuguesa e o "Triângulo". Para comprovar esta afirmação, atente-se agora às tabelas seguintes, as quais mostram os tempos de viagem (terrestre+marítima) entre a aterragem e a chegada a outra ilha e entre a partida de uma ilha e a descolagem do avião, respetivamente, tendo por base os horários regulares de inverno da Atlânticoline.

De Lisboa
(para)
Após aterragem, duração da viagem até ilha de destino
2.ª 3.ª 4.ª 5.ª 6.ª Sáb. Dom.
Pico   direto  2h30 1h30 ——— 1h30   direto  1h30
Faial
2h15
direto   direto  ———   direto  3h15
  direto 
São Jorge 6h15 irrealizável 9h00
——— 10h45
2h00
9h45

Para Lisboa
(desde)
Até descolagem, duração da viagem desde ilha de origem
2.ª 3.ª 4.ª 5.ª 6.ª Sáb. Dom.
Pico   direto  3h10
2h20 ——— 2h20   direto  2h20
Faial
3h20
  direto  direto ———
direto 1h50
direto
São Jorge 2h45
4h45 irrealizável ——— irrealizável 3h20
irrealizável

Esta análise permite tirar várias conclusões:
  • Todas as ligações Lisboa-Pico-Lisboa permitem servir não só a ilha montanha, mas também as ilhas do Faial e de São Jorge;
  • As ligações Lisboa-Horta-Lisboa servem sempre a ilha do Faial e a do Pico, mas em metade dos casos os jorgenses ou quem os visita não podem usufruir destas ligações aéreas (devido à incompatibilidade do transporte marítimo).

Por fim, falta analisar os tempos médios das viagens extra (terrestre+marítima) para outras ilhas que não aquela onde aterra o avião, considerando, no caso de São Jorge, apenas as situações em que é possível apanhar o barco — vide tabela seguinte.


Duração média da viagem extra avião
Via Pico
(chegada/partida)
Via Faial
(chegada/partida)
Pico direto 1h45/2h33
Faial
2h45/2h35
direto
São Jorge 4h08/3h03
9h50/4h45

As estatísticas são claras e objetivas: um picaroto que viaje desde ou para Lisboa via Faial demora, em média, menos de três horas na parte extra da viagem (terrestre+marítima), sendo que um faialense que viaje via Pico também demora igualmente menos de três horas nas viagens extra; já um jorgense que opte por viajar via Pico pode demorar cerca de três a quatro horas a mais (na ida e na chegada, respetivamente), sendo que via Faial o tempo da viagem extra sobe bastante, passando a demorar desde quase cinco horas até quase dez horas (na ida e na chegada, respetivamente).

Aglutinando tudo o que aqui foi dito anteriormente, embora se diga que o "Triângulo" é servido em seis dos sete dias da semana com voos diretos com Lisboa, apenas as ilhas do Pico e do Faial são bem servidas nesses seis dias, sendo que a ilha de São Jorge só é bem servida (tanto em possibilidade de realizar a viagem, como em tempo de viagem total) nos dois dias em que a ligação aérea é via Pico.

Em suma, apenas as ligações Lisboa-Pico-Lisboa conseguem servir bem todas as três ilhas do "Triângulo", comprovando-se assim que esta é uma ligação fundamental e, quiçá, a mais importante no contexto das ligações entre Lisboa e o "Triângulo".

Haja saúde!

Post scriptum: Este artigo foi publicado posteriormente na edição n.º 41.421 do 'Diário dos Açores', de 11 de novembro de 2017.

5 comentários:

  1. A reflexão está correcta e mostra a importância que tem a ilha do Pico para o desenvolvimento sustentado do conjunto das três ilhas impossível de obter por qualquer delas isoladamente. Esse desenvolvimento trará igualmente maior desenvolvimento para o arquipélago. Qualquer triângulo que se desenhe tendo em conta as três ilhas: Faial, Pico e São Jorge ( a ordem é apenas alfabética) terá os seus pontos de centralidade: ortocentro, incentro, circuncentro e baricentro na zona do eixo Madalena - São Roque, pelo que o actual aeroporto se encontra na zona certa a qual, para além da sua situação apresenta uma orografia que propicia menores custos de preparação do terreno de implantação. Porém, convém tomá-la como ponto de partida para a análise política em termos de justiça e de direitos. Ela representa a «natureza das coisas» e o seu poder deverá maior que qualquer outro. Escolher significa discriminar o não escolhido e, por isso, os custos sociais dessas discriminações devem ser minimizados. O local que reúne as melhores condições para esse efeito é aquele onde se encontra o Aeroporto do Pico.

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  2. Seria interessante ver o número de passageiros de S. Jorge que apanham voos para Lisboa no Pico e na Horta. A menos que não haja nenhum lugar disponível nos voos para a Terceira, como por vezes acontece no verão, não conheço ninguém aqui em S. Jorge que vá ao Pico, e muito menos à Horta, quando é muito mais simples e confortável voar via Terceira ou Ponta Delgada. Parece-me que todo este argumento se aproveita de S. Jorge para justificar a centralidade do Pico.

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  3. Obrigado pelo ser comentário.
    Em primeiro lugar, tem toda a razão quando afirma que seria interessante conhecer quais os passageiros de uma ilha que utilizam outro aeroporto que não o "seu", isto é:
    - Passageiros do Faial que utilizam os aeroportos do Pico e de São Jorge;
    - Passageiros de São Jorge que utilizam os aeroportos do Faial e do Pico;
    - Passageiros do Pico que utilizam os aeroportos do Faial e de São Jorge.
    Esses dados infelizmente não existem, o que não invalida o estudo feito neste artigo: mais do que saber quem usa outros aeroportos que não o "seu", se essa possibilidade simplesmente não existir, então de certeza que não há pessoas a recorreram a outras ilhas por via marítima.
    Em todo o caso, o recente parecer da Câmara Municipal de Velas sobre a petição "Pelo aumento das condições de operacionalidade do Aeroporto da ilha do Pico" mostra como o Aeroporto do Pico pode servir a ilha de São Jorge, referindo o seguinte:
    "Para a ilha de São Jorge o Aeroporto do Pico devidamente dotado das infraestruturas necessárias para a melhoria do seu serviço constitui uma alternativa às restantes Gateways da Região, por ser a que se situa mais próxima em termos geográficos".
    Haja saúde!
    http://www.caisdopico.pt/2017/11/peticao-sobre-o-aeroporto-do-pico.html
    http://base.alra.pt:82/peticao_abaixo/pe128.pdf

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  4. Olá de novo,
    Tem toda a razão na questão em que com mais e melhores voos internos, as acessibilidades para o exterior do arquipélago seriam mais rápidas e mais cómodas do que ter de utilizar o transporte marítimo.
    Contudo, e como já se observou no verão passado, não há disponibilidade de voos interilhas para servir bem todas as ilhas, sendo que os voos diretos do exterior para mais próximo do destino final é uma grande mais-valia.
    Como exemplo, se não fossem os voos diretos Lisboa-Horta-Lisboa, teria sido impossível a muita gente conseguir chegar ou sair do Pico no verão.
    Por outras palavras, entendo que a utilização do transporte marítimo não deve ser vista como primeira escolha, mas sim como escolha alternativa, aliás como muita gente do Pico e do Faial já a encara.
    O que o estudo mostrou é que o aeroporto do Pico consegue fornecer essa alternativa à ilha de São Jorge, e daí compreender a resposta da Câmara de Velas.
    Em suma, a centralidade do Pico não é o objetivo, mas sim uma mais-valia que pode ser explorada, o que significa que não se devem concentrar os voos no Pico para servir três ilhas, mas sim garantir que os voos que servem o Pico também conseguem servir as restantes ilhas do "Triângulo" — se for esta a visão, todos saem a ganhar!
    Haja saúde!

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  5. Obrigado pela resposta.

    Compreendo o argumento, mas para voos interilhas estamos servidos de forma idêntica ao Pico, portanto o "mercado" de passageiros de S, Jorge que iria ao Pico ou Horta apanhar voos resume-se apenas a quem quer ir para Lisboa.
    Destes, ninguém se vai meter com malas numa viagem que, ainda que tenha horários perfeitamente favoráveis, demorará genéricamente 1h30m em Barcos e Taxis para apanhar um voo directo, quando uma ligação simples em que se despacha as malas aqui no aeroporto, se vai para a terceira ou PDL e se usufrui de várias hipóteses de ligação em diversos horários (Porto e Lisboa).

    É natural que tenham o parecer favorável da CM de Velas como sinal de boa vizinhança, na minha opinião, é bem mais importante e mais fácil lutar por ter por cá mais voos da Sata do que andar a apoiar uma falsa centralidade.

    Apoio a vossa luta pela melhoria do vosso aeroporto, mas o caminho da centralidade só vos enfraquece a verdadeira riqueza do aeroporto do Pico está na complementariedade com o da Horta, onde tem um núcleo de habitantes "mercado" mais significativo.

    Ainda bem que citou corrigindo o erro, é uma vergonha um documento da CM nem escreverem gateway correctamente.

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