Passados cerca de três anos sobre o encerramento da conserveira Cofaco na ilha do Pico, encerramento esse que se esperava temporário, tendo em vista a promessa da construção de uma nova unidade fabril na ilha montanha, eis que surge a notícia menos desejada (mas um tanto ou quanto esperada): a Cofaco cancelou a construção de uma fábrica no Pico.
Vale a pena recordar o impacto deste encerramento, bem como situações relacionadas que ocorreram:
- [Janeiro de 2018] - Anúncio do despedimento de todos os trabalhadores da Cofaco no Pico (na sua maioria mulheres), mais concretamente 162 postos de trabalho foram extintos, os quais representavam 3% da população ativa da ilha montanha (e, se for considerado apenas o concelho da Madalena, 6% da respetiva população ativa);
- [Janeiro de 2018] - Administração da Cofaco garante que vai construir uma fábrica nova no Pico, com intenção de entrar em laboração até final de 2019 / início de 2020;
- [Julho de 2018] - Assembleia da República aprova (por unanimidade) uma resolução que recomenda ao Governo que assegure apoio social aos ex-trabalhadores da fábrica da Cofaco do Pico [note-se que esta medida, que até foi transposta para o Orçamento de Estado de 2020, nunca teve qualquer efeito prático, como comprovam as denúncias feitas em abril de 2019 e em setembro de 2020 por parte dos representantes dos trabalhadores];
- [Julho de 2019] - Administração da Cofaco reafirma construção da nova fábrica no Pico, bem como prevê o início da primeira fase até final de 2019 (embora já não se comprometa com uma data para a conclusão da obra, apontando 2022 como limite legal);
- [Setembro de 2020] - Assembleia da República aprova um projeto de lei que prolonga os apoios sociais aos ex-trabalhadores da Cofaco do Pico até janeiro de 2024 [note-se que, apesar de a correspondente lei ter sido publicada em novembro de 2020, a mesma ainda não foi regulamentada até à data];
- [Março de 2021] - Administração da Cofaco informa que já não vai construir uma nova fábrica de transformação de pescado na ilha do Pico, argumentando que o aumento dos custos de construção civil torna inviável o empreendimento.
Como se pode verificar, as únicas certezas deste longo processo foram mesmo os despedimentos; por outro lado, as promessas falsas da empresa e o incumprimento da lei por parte do poder executivo quebram a confiança das pessoas, quer no investimento futuro de privados, quer nos próprios políticos — aliás, é quase anedótico, se não mesmo vergonhoso, contar a alguém que um investidor prometeu e assegurou algo, mas depois não fez nada por causa dos custos de construção, bem como que o Governo tem uma lei para cumprir, mas não o faz! E no final, quem sofre com tudo isto? O privado? O Governo? Não, sofrem os picarotos!
'Alto e pára o baile' dirão alguns, pois o Governo Regional dos Açores adiantou no início desta semana que "há uma empresa interessada em instalar uma fábrica de transformação de pescado na ilha do Pico". No entanto, de concreto apenas uma coisa se sabe: quem quiser investir e quiser usufruir de fundos comunitários terá de executar um projeto até final de 2022.
Em suma, ao fim de três anos de promessas e incertezas, a Cofaco abandona o Pico, mas não se sabe ainda se será substituída; essa será a nova novela dos próximos dois anos, a ter lugar na ilha montanha bem perto de todos nós... Em todo o caso, qualquer que seja o guião que venha a ser seguido, uma coisa pode já ser revelada: o elenco picaroto — "o Homem e a Mulher do Pico" — irão continuar a fazer jus ao seu passado, lutando contra as vicissitudes e dureza acrescida que a vida na ilha montanha acarreta, sendo que certamente irão conseguir dar a volta por cima e superar estas novas adversidades!
Haja saúde!
Post scriptum: Este artigo foi igualmente publicado na edição n.º 42.432 do 'Diário dos Açores', de 20 de março de 2021.
Post post scriptum: Substituta da Cofaco à vista!
Post post post scriptum: [Finalmente] Conselho de Ministros aprova majoração de apoios a ex-trabalhadores da Cofaco
Abandono.
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