No seguimento de uma nova revelação sobre o “Estudo para a Avaliação das
Condições de Operacionalidade do Aeródromo da Ilha do Pico” por parte do jornal
'
Diário dos Açores'
[edição n.º 42.464, de 28 de abril de 2021] — nomeadamente a divulgação de dados
mais técnicos — e tendo em conta uma
revelação anterior por parte do mesmo periódico sobre este mesmo estudo
[edição n.º 42.457, de 20 de abril de 2021], o
parecer técnico
remetido à Comissão de Economia da Assembleia Legislativa Regional dos Açores
aquando da discussão da petição pública "
Pelo aumento das condições de operacionalidade do Aeroporto da ilha do
Pico", e as
declarações públicas sobre este tema por parte de vários responsáveis
políticos, o
Grupo 'Aeroporto do Pico'
levou a cabo uma análise comparativa de diversas soluções possíveis para a pista
do Aeroporto da ilha do Pico, análise essa que se apresenta de seguida.
Em primeiro lugar, o objetivo da presente análise é inferir quais as restrições
de operacionalidade existentes no aeroporto do Pico para o conjunto das
aeronaves de médio curso mais utilizadas no mundo, bem como qual a diminuição verificada
nessas restrições de acordo com diversas soluções possíveis para o prolongamento da pista da ilha
montanha. Para esse efeito, foram identificados 15 tipos de aviões, indicados na
Tabela 1, aos quais se juntam os aviões interilhas que operam atualmente no Pico. Para cada uma das aeronaves apresentadas indica-se
também os valores de comprimento de pista necessários para descolagem (TOR -
TakeOff Run), aterragem sem chuva (LDd -
Landing Distance dry) e
aterragem com chuva (LDw -
Landing Distance wet) —
nota importante: atendendo a que
o comprimento de pista necessário à operação de uma qualquer aeronave depende de
inúmeros fatores (designadamente modelo/variante específica, altitude da pista,
condições atmosféricas, peso a bordo, etc.), foram considerados os valores
típicos indicados pelos fabricantes para uma descolagem/aterragem ao nível do
mar, com temperatura do ar a rondar os 15 ºC e com o peso máximo admitido à descolagem
(MTOW -
Maximum TakeOff Weight) e à aterragem (MLW -
Maximum Landing Weight); para as condições de aterragem com chuva foi
considerado um valor indicativo de uma distância de travagem extra de 150 m
para todas as situações (valor este que eventualmente pecará por defeito, sobretudo para os aviões maiores), isto por não ter sido possível encontrar/aceder aos manuais específicos de desempenho com chuva das aeronaves consideradas no presente estudo.
Atente-se agora às condições atuais da pista do aeroporto do Pico: as respetivas
distâncias declaradas para descolagem (TORA -
TakeOff Run Available) e
aterragem (LDA -
Landing Distance Available) dependem da orientação da
pista, tal como indicado na Tabela 2 [anexa-se igualmente a "
Carta de Aeródromo" do aeroporto da ilha montanha]. Posto isto, na análise subsequente será
considerada a situação mais restritiva [ou seja, TORA = 1655 m e LDA =
1580 m].
Tendo então por base as revelações sobre o “Estudo para a Avaliação
das Condições de Operacionalidade do Aeródromo da Ilha do Pico”, as primeiras
duas soluções de ampliação a considerar nesta análise para a pista do aeroporto
do Pico correspondem à 'Solução 1' e à 'Solução 2' do estudo supramencionado, doravante
abreviadas por S1 e S2, respetivamente.
Em particular, a solução S1 mantém a distância de aterragem declarada atual
[LDA = 1580 m], aumentando apenas a distância de descolagem em somente 230 m
[TORA = 1885 m], isto com um custo estimado de 17,025 milhões de euros. A
solução S2, por sua vez, aumenta ambas as distâncias declaradas em cerca de
700 m e torna-as iguais [TORA = 2345 m e LDA = 2345 m], isto
com um custo estimado de 29,5 milhões de euros.
Serão igualmente consideradas nesta análise outras duas soluções adicionais: a primeira,
aqui abreviada por SP, emana do já referido parecer técnico remetido à
Comissão de Economia aquando da discussão da petição pública supracitada e é
um tanto ao quanto semelhante à solução S2 — mais concretamente, a distância
de descolagem é muito semelhante (aumento de 645 m) [TORA = 2300 m],
havendo uma diferença mais significativa na distância de aterragem declarada
[LDA = 2000 m], isto devido à assunção de áreas de segurança de fim de pista (RESAs - Runway End Safety Areas)
maiores na solução SP do que na S2; a segunda solução adicional, aqui abreviada por SA,
corresponde a uma solução alternativa onde se considera que a aeronave A321neo
consegue aterrar sem restrições (embora as mantenha à descolagem), o que
resulta numa ampliação de apenas cerca de 345 m [TORA = 2000 m e LDA
= 2000 m]. Para estas duas soluções, os custos estimados são obtidos a
partir de uma regressão linear tendo por base os custos para as soluções S1 e
S2, o que resulta num custo de cerca de 28,28 milhões de euros para solução
SP e de cerca de 20,14 milhões de euros para solução SP.
A Tabela 3 resume os dados indicados anteriormente para as distâncias
declaradas em função das diversas soluções consideradas.
Combinando os dados da Tabela 1 com os dados da Tabela 3, é possível então inferir
quais as restrições associadas a cada aeronave considerada em função da respetiva
solução de ampliação da pista do Aeroporto da ilha do Pico — estas restrições
encontram-se sintetizadas na Tabela 4, tendo por base quatro tipos de
resultados: sem restrições (OK a verde); restrições apenas à descolagem (xD a
amarelo); restrições à descolagem e à aterragem com chuva (xW a laranja); sem
condições mínimas para operação, devido a fortes restrições à aterragem mesmo com bom tempo (XX
a vermelho).
Os resultados obtidos mostram que, das 17 aeronaves
consideradas, apenas três operam sem restrições na pista atual do Pico;
notando que duas delas correspondem aos aviões utilizados nas ligações
interilhas, isto significa que apenas a aeronave de médio curso A220-100
consegue operar sem restrições na ilha montanha. Por outro lado, das 14
aeronaves que apresentam restrições com as condições aeroportuárias
existentes, cinco têm limitações menos gravosas, nomeadamente
apenas à descolagem, o que mesmo assim implica redução do alcance à partida
do Pico e/ou redução de passageiros/carga à descolagem. Os resultados
mostram igualmente como a aeronave A320 — que hoje efetua a ligação
Lisboa/Pico/Lisboa — tem restrições na aterragem na ilha montanha aquando de
dias com chuva, o que está em linha com a carga/bagagem deixada na capital
portuguesa em dias de mau tempo; conclusão idêntica é obtida para a aeronave
B737-800, a qual era
operada pela TUI na sua operação Amesterdão/Pico/Ponta
Delgada/Amesterdão, compreendendo-se assim melhor o porquê dos cancelamentos das respetivas aterragens na ilha montanha em dias de chuva.
Por outras palavras, estas duas aeronaves (A320 e B737-800) conseguem operar atualmente no Pico mas no limite mais baixo do seu desempenho.
Vale ainda a pena
notar que existem quatro aeronaves que teriam limitações muito severas se operassem
no Pico nas condições atuais, onde se inclui o A321neo — o principal modelo de médio curso da
transportadora aérea regional SATA/Azores airlines.
Recordando que a solução S1 não altera a distância de aterragem face à
situação atual, o número de aeronaves que não teria qualquer restrição sobe
de três para apenas cinco face à situação atual; por outras palavras, 12
aeronaves continuariam com algum tipo de restrição ao operar no Pico, pelo
que o investimento associado de cerca de 17 milhões de euros não traria
assim grande benefício.
Atendendo agora à solução S2, fica patente a melhoria significativa das
condições de operacionalidade que esta solução traria ao Aeroporto da ilha
do Pico: 14 das 17 aeronaves consideradas operariam sem restrições, sendo
que as restantes apenas teriam restrições à descolagem. A título de exemplo,
poder-se-ia tirar o máximo partido do A320 (avião que liga atualmente o
Pico a Lisboa) e do A321neo (maior avião da SATA/Azores Airlines), quer ainda
do B737-800 (modelo habitual da TUI e da Ryanair).
Conclusão igual à anterior
é obtida para a solução SP, pois (tal como referido anteriormente) esta
solução é muito semelhante à solução S2 (diferindo apenas em cerca de
45 m de comprimento total).
A solução SA volta a apresentar mais de metade das aeronaves com restrições
na operação no Pico — designadamente 9 em 17 — pese embora sejam restrições
apenas à descolagem. Em todo o caso, é de salientar que aeronaves como o
A320 (avião que liga atualmente o Pico a Lisboa), o A321neo (maior avião da
SATA/Azores Airlines) e o B737-800 (modelo habitual da TUI e da Ryanair) não poderiam ser
exploradas no máximo das suas capacidades.
Tendo em conta tudo o que foi dito até ao momento, fica claro que a escolha
acertada para o aumento da pista do Aeroporto da ilha do Pico recai claramente numa solução do tipo da S2 ou da SP, ou seja, um
prolongamento da ordem dos 700 m.
Alguns dirão que eventualmente a solução SA seria um bom compromisso entre o
custo da ampliação da pista e o benefício associado; no entanto, uma
poupança no investimento inicial pode se revelar uma forte perda de receita
a médio prazo. Concretizando, a diferença estimada de investimento entre a
solução S2 e a SA é de cerca de 9,36 milhões de euros, o que representa 1,4
milhões de euros para os cofres públicos regionais se houver o financiamento
habitual de 85% por parte de projetos europeus; se, devido a restrições à
descolagem no Pico, uma companhia aérea — como seja a SATA/Azores Airlines
(cujo acionista único é a Região) — tiver um prejuízo potencial médio de 2
mil euros por voo (por exemplo, por não poder vender a totalidade dos
lugares ou por ter de recusar carga aérea), e se for considerado um conjunto de 150 voos de médio curso por
ano a operar no Pico (grosso modo, o que já existe entre Lisboa e a ilha
montanha), então em cinco anos (apenas!) se perderia um milhão e meio de euros, ou seja, mais do que os 1,4 milhões
de euros poupados inicialmente!
Em suma, fica assim demonstrado como a solução adequada para a pista do
aeroporto do Pico consiste no seu aumento em cerca de 700 m, solução
esta que criaria um aeroporto capaz de servir condignamente as necessidades
atuais e futuras da ilha montanha.
Por fim, uma pequena curiosidade: se a pista do Aeroporto da ilha do Pico
aumentar exatamente 696 m, o seu comprimento passaria a ser de 2351 m, o que não
só corresponde à altitude do
ponto mais alto de Portugal, mas também equivaleria a uma solução de prolongamento da pista do tipo S2/SP, isto é, seria
igualmente uma escolha acertada — é caso para dizer que até a montanha do
Pico aponta na direção certa de quanto deve aumentar a pista do aeroporto da sua
ilha.
Haja saúde!
Grupo Aeroporto do Pico
Ivo Sousa
Bruno Rodrigues
Luís Ferreira
Post scriptum: Este artigo foi igualmente publicado na edição n.º 1432 do 'Ilha Maior', de 28 de maio de 2021, e na edição n.º 42.489 do 'Diário dos Açores', de 29 de maio de 2021.